ANTES DA GRANDE REPERCUSSÃO
Promotor elogiou conduta de delegados que despiram escrivã à força
“Não vislumbro crime de abuso de autoridade na conduta do Delegado de Polícia Eduardo Henrique de Carvalho Filho e/ou membros de sua equipe (…) posto que, a meu ver, não agiram movidos por interesse pessoal ou por ódio, mas por zelo à administração pública. (…) Agiram portanto, estritamente no exercício de suas funções policiais”.
Com essas palavras, o promotor de Justiça Lee Robert Kahn da Silveira pediu ao juiz da Vara Distrital de Parelheiros o arquivamento do inquérito policial instaurado para apurar abuso de autoridade na lavratura da prisão em flagrante da escrivã V.F.S.L. por prática de concussão, no que foi atendido. As imagens, que revelam as humilhações sofridas pela investigada, foram divulgadas em primeira mão pelo Blog do Pannunzio e pelo Jornal da Band da última sexta-feira (veja o post aqui).
Além de elogiar o comportamento dos delegados-corregedores, o promotor de Justiça a cargo do caso escreveu, em sua fundamentação, que “à polícia será sempre permitido relativo arbítrio, certa liberdade de ação, caso contrário esta se tornaria inútil, ensejando vença e impunidade, ante os obstáculos que surgem para a apuração e descoberta de fatos delituosos”.
O representante do Ministério Público baseia seu juízo de valor em impressão subjetivas para pedir a absolvição dos delegados. Segundo ele, as imagens do video mostram que “o clima existente no local dos fatos ficou bem adverso a (SIC) atuação destes, aliás, muito idêntico áquele retratado nos filmes, quando policiais são investigados por outros policiais”.
Em seguida, Lee Robert Kahn da Silveira chega a culpar a vítima pelas sevícias por ela sofridas: “Em determinado momento foi necessário o uso de algemas para dominá-la, vez que ela se tornou histérica e agressiva”.
Apesar da anotação do Promotor, não há, nos quase 13 minutos da gravação, nenhum registro de “histeria” ou de ” agressividade” contra os policiais. O uso das algemas foi determinado pelo delegado-corregedor em face da recusa da investigada de se despir diante dos pelo menos seis homens que se encontravam na sala onde ocorreu a prisão em flagrante.
Outro detalhe curioso anotado pelo Promotor, que não encontra amparo nas cenas gravas divulgadas pelo Blog, é a revelação de que V.F.S.L., “ainda quando estava imobilizada pelas agentes femininas, em um rompante, conseguiu pegar e rasgar duas das notas de cinquenta reais”. No video, a escrivã aparece subjugada, ainda no chão, algemada, enquanto o delegado exibe as cédulas para a camera.
O inquérito também não define com exatidão quem determinou que V.F.S.L. fosse despida. No video, ouve-se claramente quando o delegado Eduardo Henrique de Carvalho Filho agtribui a determinação a seu chefe imediato. Em seu depoimento, no entanto, o Delegado Emílo antônio Pascoal, chefe da Divisão de Operações Especiais à qual o corregedor estava subordinado, afirmou que “jamais autorizou ou determinou que a escrivã fosse desnudada por policiais do sexo masculino. Autorizou que a revista fosse realizada dentro dos ditames legais, ou seja, por policiais femininas”.
DEPOIS DA GRANDE REPERCUSSÃO
MP tenta reabrir investigação sobre abuso de autoridade contra escrivã
O MP-SP (Ministério Público de São Paulo) tenta reabrir a investigação sobre a denúncia de abuso de poder numa delegacia. O abuso aconteceu quando policiais despiram uma escrivã à força em busca de provas de que ela teria recebido propina. As imagens da ação, que aconteceu em junho de 2009, foram divulgadas em primeira mão pelo Jornal da Band.
Nesta segunda-feira, os delegados Eduardo Henrique de Carvalho Filho, Gustavo Henrique Gonçalves e Renzo Santi Barbin, envolvidos no caso foram afastados. Eles, junto com o então delegado divisionário Emílio Antônio Pascoal, passarão por novo processo administrativo, que será supervisionado pela corregedora Maria Inês Valente. A mesma que considerou legal a ação dos subordinados.
As principais autoridades de São Paulo sabiam da operação da Corregedoria. Em dezembro do ano passado, a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) enviou ofícios com cópia da gravação para o então governador, Alberto Goldman, o procurador-geral de Justiça, Fernando Grella, e o secretário de Segurança Pública, Antônio Ferreira Pinto. A própria chefe da Corregedoria confirmou que o secretário sabia das imagens.
Atualmente, o caso está sendo analisado pelo Gecep (Grupo de Controle da Atividade Policial). Os promotores não concordam com o arquivamento do processo por abuso de autoridade e querem encontrar uma forma jurídica de reabrir o caso - que tinha sido arquivado pela Justiça, a pedido do próprio Ministério Público.
MP já designou promotores para reabrir investigação da “Operação Pelada”
Luciana Frugiuele, Promotora de Justiça há 15 anos, integrante do Grupo de Ação Especial para o Controle Externo da Atividade Policial (GECEP), é quem vai coordenar as investigações sobre o comportamento dos delegados da Corregedoria da Polícia Civil de são Paulo que participaram da chamada Operação Pelada.
A ordem da Procuradoria-Geral é não poupar esforços para encontrar um caminho que permita a reabertura do caso. O desafio é grande. O primeiro inquérito policial foi arquivado a pedido do procurador Lee Robert Kahn da Silveira. Além de não enxergar abuso nas imagens que chocaram o País, ele ainda elogiou a atuação dos delegados (veja post sobre o assunto aqui). Como o pedido do promotor anterior foi acatado pelo juiz da Vara Distrital de Parelheiros, onde corria o inquérito, os três promotores que integram o grupo estão trabalhando em conjunto.
Não é difícil vislumbrar a divergência deles em relação a Kahn da Silveria. Hoje de manhã, Fernando Albuquer Souza, um dos integrantes do CEGEP postou no Facebook uma mensagem que pode sintetizar a disposição do trio. “Para aqueles que têm acompanhado as notícias do caso da escrivã de polícia que foi despida em busca do dinheiro ilegalmente recebido, informo que o inquérito policial foi arquivado a pedido da Promotoria de Parelheiros. Eu e meus colegas, integrantes do GECEP, respeitosamente discordamos desse posicionamento por entender que a busca foi contrária à lei”.
A primeira providência, que já foi tomada, foi oficiar a Corregedoria solicitando o envio de todo o material que integrou os procedimentos administrativos. Os passos seguintes não serão divulgados porque, segundo Luciana Frugiuele, envolvem as intimidades da vítima, o sigilo a que os delegados têm direito e a privacidade de muitas outras pessoas. “Nada aqui será violado, nem em nome da contenção do clamor público”.
“Vocês só vão saber o resultado quando todos os elementos forem colhidos e permitirem uma conclusão”. A promotora, no entanto, pede que a população confie no Ministério Público. “Nós vamos dar o máximo do nosso esforço para que seja feita justiça nesse caso”, arremata Frugiuele.
Fonte: http://www.pannunzio.com.br/?p=7177